Saturday, March 24, 2007

Caos aéreo: uma proposta

Há algo de interessante em ficar nos aeroportos por muito tempo. Pode-se observar a “elite” dos aeroportos: desde políticos de esquerda, líderes sindicais, estudantes, artistas, o padeiro da esquina até seu vizinho médico.

Uma “elite” bem abrangente, não? Todos sofrem com o atraso dos vôos que, desde o acidente do Gol*, tornou-se subitamente frequente no Brasil.

Afirmam que há uma “operação padrão” e uma comissão foi criada para investigar, embora o objetivo não seria o de procurar culpados (o que deixa qualquer um perplexo com esse gasto de dinheiro público).

Outros dizem que tudo melhoraria se o controle aéreo mudar de militar para o civil, mas não explicam como isto resolveria o problema do tal “radar” ou do Cindacta 1. Seria um homem sem uniforme melhor para operar um radar do que um militar?

Até onde sabemos, a vestimenta não influi no grau de (in)competência de quem faz o serviço. Em meio ao tumulto dos aeroportos, há invariavelmente dois tipos de opiniões: uns acham que a culpa é das companhias e, outros, que é do governo.

É difícil cobrar perfeição das companhias se não possuem informações dos controladores. Por outro lado, falhas de administração são, no mínimo, motivo para levar os funcionários de volta às aulas de pesquisa operacional. De quem é a culpa? Aparentemente, se sabe que não é dos consumidores.

O que fazer? Uma sugestão simples: incentivos econômicos. Crie-se uma multa, na forma de devolução de parte do valor da passagem. Não é uma idéia nova, mas talvez o que não tenha sido pensado é sobre quem deve arcar com o ônus da multa.

O valor do ressarcimento seria dividido entre a Anac e a companhia aérea. Seria uma média ponderada na qual os pesos seriam definidos pela responsabilidade de cada um. Como medir isto? Há várias formas.

Uma opção seria fazer uma pesquisa com os passageiros. Numa cédula simples, a culpa é: a) da Anac; e b) da companhia.

Votos em branco contariam contra ambos. Um acordo com as companhias de telefonia celular tornaria essa votação barata e de apuração imediata (um placar no aeroporto tornaria pública a divisão do valor da multa, sem necessidade de criar outro órgão para fiscalizar a pesquisa...).

Como seriam pagas as contas? No caso da companhia, obviamente, os recursos sairiam da empresa em forma de retorno monetário para os passageiros: um DOC é muito fácil de ser feito hoje.

No caso da Anac, os recursos sairiam de seu orçamento (ou, para facilitar a vida dos burocratas, poderiam ser abatidos no Imposto de Renda das pessoas, obviamente com a mesma correção aplicada às parcelas devidas).

Em outras palavras, ambos seriam punidos pelo custo que impõem aos consumidores, que compram as passagens, não descumprem o compromisso de pagá-las e chegam no aeroporto no horário.

Justiça social é isto: cada um arca com os custos de suas ações e é recompensado por elas. No caso de falhas, a recompensa é negativa. Nada mais justo.

CLÁUDIO SHIKIDA - economista e professor do IBMEC-MG

artigo originalmente publicado no jornal O TEMPO, na Quinta-feira, 22 de Março de 2007.
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*para saber mais detalhes sobre o acidente citado no texto, o leitor pode consultar o especial feito pelo Folha de São Paulo aqui.